domingo, dezembro 11, 2016

No equilíbrio está a virtude


Muito se tem falado nos últimos dias sobre o momento de forma de ambos os rivais da Segunda Circular. Sobre qual deles chega em pior momento. Os tricampeões nacionais perderam duas vezes no espaço de cinco dias. primeiro no Funchal, frente ao Marítimo, deixando o rival Sporting com a possibilidade de assumir a liderança em caso de vitória no derby, depois em casa frente ao Nápoles para a Champions, num desaire que acabou por ter pouca importância dado que apurou os encarnados para os oitavos-de-final da liga milionária. Já o Sporting, apesar de encurtar a vantagem para o líder na Liga, viu uma derrota comprometedora na Polónia, frente ao Légia de Varsóvia, atirar os leões para fora das competições europeias, falhando o objetivo menor que seria o apuramento para a Liga Europa.

Este texto não visa fazer análises sobre o momento de forma, pois num jogo desta natureza isso acaba muitas vezes por ser pouco importante, dada a superação anímica das equipas nestes derbies. Para além de que ambos parecem não estar propriamente no pico de forma. São vários os motivos para que tal aconteça, ainda que sejam diferentes em casa um dos casos. E acima de tudo, como o título o indica, ambos andam em busca dos equilíbrios que podem valer o sucesso na época.

Um clone para Pizzi
Na temporada passada, Pizzi assumiu-se como um dos mais importantes elementos dos tricampeões nacionais, jogando sempre a partir da ala direita, não tendo de ser opção como oito, como agora acontece, dado existir Renato Sanches. E o médio português foi fundamental até para gerar os equilíbrios que por vezes o "espírito selvagem" de Renato Sanches rompia com desposicionamentos ou perdas de bola em fases de construção.

No início desta época, com Renato Sanches em Munique, emergiu outro jovem talento, André Horta, com características muito diferentes do "Bulo". Mais paciente e mais tecnicista na construção, consegue juntar raça e determinação na procura da recuperação, ainda que com muito menor capacidade nesse capítulo, assim como um enorme défice físico face ao seu antecessor. E Pizzi continuou nas alas, agora na esquerda dado o regresso de Salvio, que assumiu a ala direita.

Com Pizzi nas alas, Rui Vitória assegura um médio que centra muito do seu jogo em movimentos interiores, tanto a defender como a construir. Isso permite que apesar de apenas ter dois médios centro, Vitória possa contar com um terceiro apoio que ajuda a equipa em especial nos jogos contra adversários mais fortes, que muitas vezes jogam com três elementos da zona central.

Contudo, a lesão de Horta obrigou o técnico das águias a abdicar de Pizzi nas alas e a deslocá-lo para o meio, à frente de Fejsa. E as coisas correm bem nos jogos contra adversários pequenos. Porque ganha mais capacidade de construção face a Horta e fica com duas setas apontadas ao adversário nas alas, com um futebol mais vertical e repentista. Mas frente aos adversários mais fortes, nota-se uma gritante incapacidade de controlar o jogo uma vez que ninguém faz os movimentos interiores para gerar o terceiro homem no meio-campo e Pizzi tem um enorme défice tanto na recuperação como na construção quando pressionado.

Isso notou-se no Dragão, mesmo na Turquia frente ao Besiktas, apesar dos encarnados terem estado a vencer por 0-3, e mais recentemente frente ao Nápoles. A derrota na Madeira foge um pouco a estas contas dado que nessa partida foi acima de tudo a ineficácia na finalização e a permeabilidade nas costas da defesa a ditarem o insucesso.

Dado que Pizzi terá que continuar a jogar a 8 até ao regresso de Horta, que se prevê para breve, apenas uma solução nos parece possível para tentar reequilibrar a equipa e mesmo essa é muito diferente de ter Pizzi na ala. Como não é possível cloná-lo... Essa solução chama-se Rafa. O médio ofensivo português é o único dos extremos dos encarnados que tem passado como médio pelo corredor central, ainda que mais próximo do avançado. Apesar de ser um jogador muito vertical e com capacidade de penetração, é também o único que apresenta qualidade na construção de uma forma mais cerebral. Falta-lhe certamente aptidão na recuperação, algo que Pizzi também não é exímio mas ainda assim consegue fazer de forma minimanente aceitável.

Irá Rui Vitória apostar em Rafa no derby? E se sim, quem sairá? Cervi? Salvio? Gonçalo Guedes? Qualquer um dos argentinos parece sério candidato a sair para entrar o português, até porque tirar Gonçalo Guedes tem-se revelado desastroso nos últimos jogos da Champions, pois coincide sempre com o momento cai no jogo. Guedes dá uma enorme capacidade de pressão à saída de bola na primeira fase de construção do adversário. Já entre os argentinos, Salvio parece claramente fatigado e em perda, pelo que não surpreenderia se fosse ele a sair do onze.


A chave Bruno César
Como aqui escrevi há cerca de mês e meio, a saída de João Mário foi fatal para os leões. Tal como Pizzi no Benfica, João Mário equilibrava a equipa com os seus movimentos interiores, numa estratégia que Jorge Jesus já tinha imposto com sucesso no primeiro ano na Luz, com Ramires a assumir idêntico papel. A perda do médio leonino, associada à perda de Slimani que tinha uma inesgotável capacidade de pressão, deitou por terra tudo aquilo que o técnico dos leões tinha alcançado no primeiro ano em Alvalade.

Obrigado a reencontrar uma equipa que tinha perdido o seu pêndulo, o início da temporada foi penoso com os leões a atrasarem-se significativamente na classificação face aos rivais da segunda circular. E apenas quando Bruno César se assumiu em definitivo como a solução, quer seja a partir da ala esquerda, quer seja atrás do avançado, os verde-brancos melhoraram, ainda que estejam muito longe do que mostraram na temporada transacta.

O médio brasileiro é um jogador com conhecimento nos movimentos interiores e pelos corredores, pelo que garante algumas parecenças com o futebol de João Mário em termos de posicionamento. É mesmo o único do plantel leonino com estas características, apesar de estar a anos-luz da qualidade do agora médio do Inter. Por isso a qualidade dos de Alvalade é significativamente inferior à que apresentou em 2015/2016, vivendo em total dependência da criatividade e velocidade de Gelson Martins e da combativivade de inteligência do capitão Adrien Silva. Estes são sem dúvida os dois jogadores fundamentais dos leões. E como se viu no mês passado, a ausência do capitão coincidiu com um período de maus resultados do Sporting. Imagine-se se se visse privado dos dois em simultâneo!

Bruno César está longe de ter a preponderância de ambos ou a sua qualidade. Mas em termos de posicionamento é fundamental para o equilíbrio da equipa de Jesus. Até porque é de todos no plantel aquele que melhor conhece as ideias do seu treinador dado o seu passado com ele no Benfica.

Dentro de poucas horas saberemos as opções e o resultado final do apaixonante derby de Lisboa, mas uma coisa é certa, o equilíbrio de cada uma das equipas será certamente decisivo para o desfecho da partida. Provavelmente, o talento individual e coletivo fará a diferença, mas sempre graças a quem levar a melhor nesta batalha dos equilíbrios dos meio-campos.


ESTE TEXTO FOI TAMBÉM PUBLICADO NO BLOGUE BOM FUTEBOL

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