domingo, junho 14, 2015

Portugal merecia continuar a sonhar!



O desporto nem sempre é justo. O que aconteceu esta madrugada do outro lado do mundo, na Nova Zelândia, é das maiores injustiças que uma nova geração de brilhantes futebolistas portugueses mereceram. Perderam frente a uma caricatura de equipa de futebol brasileira que deve deixar às voltas na tumba outras glórias da Canarinha.

Portugal foi melhor de início ao fim. Não merecia ter ganho, merecia quase ter goleado. Falhou golos em catadupa. Atirou ao poste ao cair dos 90 minutos. No prolongamento teve a grande ocasião da partida com Gelson Martins a falhar completamente isolado.

O Brasil defendeu. Defendeu. E recusou jogar à bola. Dois jogos seguidos a empatar a zero e a passar nos penalties devia dar direito a desclassificação por atentado ao futebol. Que o Senegal (que Portugal venceu na fase de grupos com uma perna às costas...) faça justiça nas meias-finais e atire o Brasil para fora porque seria um crime esta seleção brasileira ganhar o que quer que seja.

Quanto a Portugal, fica para a história um Mundial brilhante que merecia ser coroada com pelo menos a chegada à final. Portugal foi de longe a melhor seleção deste mundial, infelizmente não consegue chegar onde merecia.

Mas ficam muitos valores para o imediato do futebol português. Um guarda-redes com muito valor, André Moreira, dois laterais fiáveis e com capacidade ofensiva, o leão Riquicho e o dragão Rafa, dois centrais de excelente nível, com destaque para João Nunes, do Benfica, que foi uma das figuras deste Mundial, bem secundado pelo leão Domingos Duarte. No meio-campo o farol da equipa, o homem-invisível, o capitão Tomás Podstawski, do FC Porto, para mim  melhor jogador de Portugal neste Mundial, está em todo o lado mas não se dá por ele, corre kms e é o primeiro a construir. Tomás que teve no luso-brasileiro Raphael Guzzo, do Benfica, um companheiro à altura, pois foi outro dos destaques desta seleção. Tem grande capacidade de passe, faz movimentos verticais que causam muitos desequilíbrios e revela grande pontaria no remate (excepto no penalty displicente que foi o princípio do fim do sonho).

Rony Lopes, formado no Benfica, mas há vários anos no Manchester City (esteve emprestado esta época ao Lille) é o artista da equipa. Tem tudo para ser um jogador de top. Falta-lhe talvez dar um pulo físico para o conseguir. Fez um Mundial em crescendo e hoje atingiu o seu melhor. Pode jogar a 10, posição original, ou na ala. O seu toque de bola está apenas ao nível dos predestinados. Na frente teve a companhia de Gelson Martins, o jogador do Sporting, que foi mais um jogador em grande na Nova Zelândia. O extremo é muito rápido, tem grande capacidade técnica e de decisão. Foi decisivo na passagem aos quartos e hoje teve nos pés a passagem às meias. Desta vez não conseguiu mas é outro jogador para quem se tem de olhar de imediato.

Na outra ala nunca houve um titular. Gonçalo Guedes do Benfica, o mais jovem da Seleção, não conseguiu exibir-se ao seu melhor nível, parecendo algo cansado de uma época em que chegou à primeira equipa do Benfica. O seu colega de clube Nuno Santos foi o joker. Sempre que saía do banco marcava ou assistia. Conseguiu 2 golos e 3 assistências no Mundial e hoje voltou a dar o golo a Gelson, que falharia na cara do guardião do Brasil. É um extremo à antiga, com um pé esquerdo que faz maravilhas, especialmente cruzamentos com conta, peso e medida. O quarto extremo foi Ivo Rodrigues, também ele se exibiu em boa forma, marcou golos e desequilibrou na maioria dos minutos em que jogou.

Por fim, o ponta-de-lança André Silva. É um raro exemplo de avançado em Portugal. Capacidade física, jogo aéreo, bons pés, joga de costas para a baliza, movimenta-se muito bem nos espaços. Tem tudo para ser craque. Apostem nele por favor!!

Acabou o sonho que nos deu madrugadas para mais tarde recordar.

quarta-feira, junho 03, 2015

O campeão anti-emoções


Acabou! A época 2014/2015 chegou ao fim no passado domingo, com a final da Taça de Portugal. Uma época marcada por um domínio encarnado de início ao fim na Liga Portuguesa, depois de cenário idêntico há um ano. Mais de 30 anos depois, os encarnados conseguiram o bicampeonato e colocam em causa, pela primeira vez nestas três últimas décadas, a hegemonia de títulos do FC Porto.
A isso junta-se o regresso aos títulos do Sporting, que sete anos depois festeja um troféu, mais concretamente a Taça de Portugal.

Na hora do balanço final, importa olhar também para aquele que foi o lançamento da temporada e o balanço a meio da época. Aqui escrevi no arranque que o Sporting poderia ter alguma vantagem caso arrancasse forte, fruto de ser quem mantinha o esqueleto da equipa do ano anterior. Como contra, tinha a alteração de treinador. Verdade é que não o conseguiu fazer e acabou por ser o Benfica, apesar das muitas baixas no plantel, a conseguir tomar a liderança, que nunca largou ao longo de todo o campeonato.

É preciso reconhecer mérito a quem o tem e Jorge Jesus foi mais uma vez o obreiro da vitória. Soube com os menores meios que tinha gerir a equipa e torna-la sólida o suficiente para vencer a Liga. Perdeu importantes peças face a 2013/2014, mas conseguiu tornar a defesa ainda mais forte (à imagem da segunda metade da temporada transata), com destaque para a contratação de Júlio César, fundamental na equipa, e para a afirmação de Jardel (continuo a achar que é curto para a Europa mas é fantástico a nível interno). Fez de Samaris um novo esteio do meio-campo, de Pizzi o novo maestro da equipa e viu Jonas, o brasileiro que estava desempregado e que chegou depois do fecho do mercado no verão, ser a peça-chave para o título com os seus golos.

A péssima prestação europeia acabou por ser fundamental para este Benfica. Jesus chegou a rodar a equipa na Champions demonstrando que nem ele acreditava ser possível ganhar a Liga se continuasse a tentar repetir o sucesso europeu das duas épocas anteriores. Assim, teve uma segunda metade da época a jogar praticamente apenas para a Liga Portuguesa, uma vez que caiu aos pés do finalista Sp.Braga na Taça de Portugal. Sobrou a Taça de Liga, mas essa foi praticamente jogada toda em janeiro, o que pouco influenciou em termos de calendário o resto da temporada.Com estes trunfos, Jesus pôde jogar sempre com o seu melhor onze (apenas algumas lesões dos alas Gaitan e Sálvio complicaram aqui e ali, especialmente no caso de Nico cujas ausências coincidiram com as duas derrotas na 2ª volta).

A vitória dos encarnados não sofre contestação. Foram os mais fortes. Os mais regulares. Tiveram momentos de grande qualidade, principalmente nos jogos em casa, com jogos empolgantes. Mas acabaram por ser o anti-êxtase da Liga. Nos dois jogos decisivos da temporada, somaram dois empates fundamentais para o título, demonstrando que o pragmatismo vale êxitos. Em Alvalade tiveram postura expectante, quase perdendo perto do fim, mas no último segundo conseguiram o empate que acabou por ser decisivo. Depois, no que muitos chamaram O Jogo do Título, empate a zero no Estádio da Luz frente ao FC Porto, num dos mais desinteressantes jogos da história dos clássicos e certamente o mais chato da era Jesus na Luz. Mas a verdade é que o empate chegou. O espectáculo ficou para outros momentos.

Com este bicampeonato, os encarnados lançam claramente a questão de que este poderá ser o início de uma nova era de domínio no futebol português. Sabe-se que Jesus pode estar à beira de sair e que o desinvestimento pode ser uma realidade, mas a estrutura encarnada está muito forte e acredito que não será por mudarem algumas peças (treinador incluído) que o edifício voltará a abanar. O FC Porto é um bom exemplo disso. Vamos ver nos próximos dias qual será a realidade imediata da equipa em termos técnicos e de contratações.

Mudando agulhas para o norte, o FC Porto acabou por falhar rotundamente esta época. Fez um fortíssimo investimento. Construiu um plantel próximo do nível apresentado pelo Benfica nas últimas duas temporadas, mas nada ganhou. As rotações de Lopetegui no início da época saíram caro. Deu avanço ao Benfica, que nunca conseguiu recuperar e saiu da Taça de Portugal em pleno Dragão com o Sporting, que acabaria por conquistar a prova rainha do futebol português. Salvou-se uma meritória campanha europeia, apesar de ter tido fraca oposição até aos quartos-de-final da prova. A vitória por 3-1 ao Bayern de Munique foi o ponto alto, mas a goleada com que saíram vergados da Allianz Arena remeteu para os anais do esquecimento tão espectacular exibição na primeira mão.

Dois anos sem títulos significarão desinvestimento também para os lados do Dragão? Lopetegui vai continuar e tem a vantagem de agora já conhecer a realidade da Liga Portuguesa. Vamos ver se os trunfos que lhe dão serão tão fortes como os desta temporada. Se o forem, está definitivamente obrigado a ganhar pois caso falhe o que se seguirá para o clube poderá ser preocupante.

Por fim, o Sporting. No clima de guerra surda, entre Presidente e Treinador, que quase levou à saída de Marco Silva em dezembro, os leões acabaram por conseguir segurar de forma cómoda o terceiro lugar que lhes dá acesso ao playoff da Champions. Foram os serviços mínimos em termos de Liga, mas tendo em conta o mau arranque, com muitos empates, dificilmente se poderia exigir mais. Bruno de Carvalho elevou talvez a fasquia em demasia e apesar da qualidade da equipa, a verdade é que o Sporting continua alguns degraus atrás de Benfica e Porto e isso é difícil de contrariar.

Mas se a Liga não correu como desejado, a época até foi bastante positiva. Na Champions, a passagem à fase seguinte falhou por muito pouco e à custa de uma arbitragem vergonhosa na Alemanha frente ao Schalke. A Liga Europa foi madrasta, com a surpresa alemã, o Wolfsburgo a eliminar os leões, eles que foram segundos na Bundesliga e conquistaram a Taça da Alemanha. Porém, o balanço até foi positivo em termos europeus, depois de um ano fora dos grandes palcos europeus.

Acabaria por ser no passado domingo, no Jamor, que chegaria o tal momento pelo qual tanto ansiavam os adeptos leoninos. Uma vitória que já ninguém esperava, arrancada a ferros, nos penalties, depois de 100 minutos a jogar com menos um e a ter de recuperar uma desvantagem de dois golos. Grande coração de leão, mas sem retirar mérito ao querer e vontade dos verde-brancos, uma grande dose de demérito de uma equipa arsenalista que não soube controlar um jogo que estava decidido a menos de 10 minutos do fim, com vantagem de dois golos no marcador e superioridade numérica há mais de uma hora.

O que fica para a história é a vitória leonina e o regresso aos títulos sete anos depois. Marco Silva conseguiu assim dar continuidade ao seu brilhante percurso enquanto técnico, depois dos feitos no Estoril. Manteve a qualidade que a equipa mostrou com Leonardo Jardim, mas num contexto mais exigente, com competições europeias pelo meio. A conquista da Taça acabou por ser a cereja numa época de evolução. Não faz qualquer sentido recomeçar do zero novamente. Mas parece inevitável. O divórcio entre Bruno e Marco é claro e por muitos desmentidos que façam, torna-se óbvio que não haverá outro desfecho.

Será que vai ser mais emocionante o arranque do defeso do que foi a época? Sinceramente, acho que sim. Como será o Benfica pós-Jesus? Resistirá o Sporting a uma terceira mudança de técnico em três anos (e fala-se que poderá continuar a investir sem vender as suas pérolas, apesar de não ter apuramento para os milhões da Champions assegurados e sabendo que poderá apanhar um tubarão no playoff por não ser cabeça-de-série)? Irá Marco Silva para a Luz? Ou Rui Vitória? E Jesus poderá mudar de clube na 2ª circular, regressando a uma casa onde passou como jogador? E já agora, que meios terá Lopetegui ao seu dispor? Novo investimento quase cego para acabar com o jejum?

São muitas as questões. Certezas nenhumas. Se calhar a montanha até poderá parir um rato. Seguem-se apaixonantes episódios das novelas do defeso.

P.S.: Uma palavra de destaque para Vitória de Guimarães e Belenenses. Conseguiram ambos apurar-se para a pré-eliminatória da Liga Europa. Os vimaranenses fizeram uma época de sonho sem meios. Aposta em jovens formados na casa, a maioria provenientes da Equipa B, sem experiência de Primeira Liga. Um mérito de Rui Vitória que conseguiu o impensável ao longo destes quatro anos na cidade-berço. Alguém conseguiria iguais feitos com recursos tão limitados? Este elogio é extensível aos homens do Restelo. Uma equipa repleta de jovens portugueses que após o regresso à Primeira Liga há um ano, conseguiram com maior rodagem atingir um brilhante sexto lugar, mesmo com instabilidade entre direção da SAD e treinador, que levou à ruptura com Lito Vidigal, que foi o principal responsável pela época de sucesso dos azuis. Dois exemplos de como a aposta nos jovens jogadores formados em Portugal compensa bem mais do que trazer paletes de estrangeiros sem qualidade para o nosso país. Talvez tenha chegado a hora dos grandes começarem a apostar neste caminho.